Tecnologia pela vida



Um procedimento simples de reprodução assistida devolveu a Kátia*, 26 anos, a esperança de ser mãe e gerar uma criança sem o HIV. Ela não tem o vírus da aids, mas o companheiro, sim. A sorologia positiva do marido fazia com que o assunto fosse tabu entre o casal, junto há 12 anos, e agora à espera do primeiro filho.

“Chegamos a conversar com os médicos sobre a concepção natural. Mas meu marido, mais do que eu, tinha muito medo de que eu ou a criança pudéssemos ser infectados. Foi quando soubemos dessa técnica e ficamos bastante empolgados”, conta. Kátia está se referindo à lavagem de esperma, método em que o sêmen é preparado e, sem o vírus, inseminado na mulher.

A técnica, criada em 1997 por cientistas italianos e disponível no Brasil desde 2000 em um centro de reprodução humana em Campinas (SP), agora é ofertada, de graça, no Centro de Referência e Treinamento (CRT) da Secretaria de Saúde de São Paulo. Trata-se de um projeto de parceria entre o CRT e o Centro de Reprodução Assistida em Situações Especiais (CRASE), da Faculdade de Medicina do ABC, financiado pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS).

O primeiro passo para o casal sorodiscordante (em que um dos parceiros tem HIV e o outro não) que gostaria de ter um filho e quer fazer o tratamento no ambulatório do CRT é descartar a possibilidade de infertilidade. “Para isso, o homem faz um espermograma e a mulher, uma radiografia contrastada do útero e das trompas. Verificamos, também, se a candidata tem ciclo menstrual regular”, explica o ginecologista e obstetra Waldemar Carvalho, especializado em reprodução assistida e o responsável pelo projeto no CRT.

Entre os casos mais frequentes de atendimento no ambulatório do CRT, estão os casais em que a mulher é soronegativa e o homem, soropositivo. “É aí que entra o serviço oferecido pelo CRASE: evitar a transmissão do HIV do homem para a mulher e, consequentemente, para a criança”, diz.

Waldemar explica que o procedimento, que só pode ser realizado em casais férteis, é simples: “o sêmen é colocado em meio de cultura e centrifugado. Durante o processo, sua carga viral é medida até que esteja livre do vírus. Quando isso acontece, o sêmen já lavado é inoculado no útero da mulher”.

O caso de Kátia foi um sucesso. Ela conseguiu engravidar na primeira tentativa do procedimento. “Fizemos surpresa para ele. Fomos ao CRASE e ele pensou que se tratava de uma coleta de esperma para exames iniciais. No mesmo dia, o sêmen estava pronto e fizemos a inseminação”, conta. Depois de dois exames de farmácia negativos, finalmente a boa notícia. “Meu marido chorou. Sempre quis ser pai. Estamos muito felizes”.

A técnica do preparo de sêmen é indicada até mesmo para casais soroconcordantes (em que os dois têm o vírus) para diminuir os riscos de reinfecção, ou seja, de ser infectado pelo HIV mais de uma vez. Isso porque há diferentes tipos do vírus e um pode reinfectar o outro. Em muitos casos, inclusive, pode acontecer a transmissão de uma cepa (tipo) que seja resistente aos medicamentos que a pessoa já estava tomando.

Em dois anos do projeto, 235 casais procuraram o serviço e 98 foram selecionados. Quarenta e cinco já se submeteram à técnica e 13 deles estão à espera do primeiro filho. “Como envolve baixo custo, queremos mostrar, com o projeto, que se trata de um procedimento viável para o SUS. O preparo do sêmen é considerado hoje o gold standard (padrão ouro) dos tratamentos”, defendeu Waldemar.

Mulher soropositiva

Há outros casos em que é a mulher quem tem o vírus e o parceiro não. De acordo com Waldemar, a orientação para o casal é realizar a autoinseminação. “Eles podem fazer em casa mesmo. O homem deposita o sêmen em um potinho e colhe com uma seringa, que é injetada na vagina da mulher”.

O médico deve estar atento e conversar com a mulher soropositiva que pretende engravidar – e está em uso regular de antirretroviral – sobre a questão da medicação, pois pode haver indicação de troca de medicamento por risco de efeito teratogênico (que provoca malformação fetal). “Se a mulher estiver utilizando um desses medicamentos, deve trocá-los bem antes de engravidar”, explica a médica infectologista Rita Manzano Sarti, coordenadora do ambulatório do CRT.

Para ela, a questão da saúde reprodutiva deve ser sempre abordada pelos infectologistas com seus pacientes. “Os casais têm o direito de saber que podem ter filhos. A aids hoje tem outro perfil e, com as medidas preventivas adequadas, o risco de transmissão é inferior a 1%”, esclarece.

Outra estratégia para reduzir a transmissão vertical (da mãe para o filho) preconizada pelo Ministério da Saúde é a utilização de AZT endovenoso pela gestante, desde o início do trabalho de parto até o corte do cordão umbilical. Em caso de cesárea, o medicamento deve ser administrado três horas antes da cirurgia. O Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais publicou, em outubro de 2010, um suplemento às “Recomendações para Terapia Antirretroviral em Adultos Infectados pelo HIV”, contendo estratégias de redução de risco para casais sorodiscordantes ou soroconcordantes que desejam ter filhos.

O recém-nascido também é medicado com xarope de AZT no momento do nascimento (ou no máximo até duas horas depois), mantendo-se o tratamento durante as seis primeiras semanas de vida (42 dias).

A mulher que vive com HIV também não pode amamentar e o bebê deve ser alimentado com fórmula infantil (leite artificial). O Departamento elaborou um manual para auxiliar as mães: é o “Guia prático de preparo de alimentos para crianças menores de 12 anos que não podem ser amamentadas”.

*Nome fictício, a pedido da entrevistada.

Por Gabriela Campos

fontte: http://www.aids.gov.br

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